domingo, 2 de outubro de 2011

Ê, meu amigo Charlie Brown

Um dos melhores presentes que já ganhei foi aos 14 anos. Minha mãe me deu de Natal o livro Toda Mafalda, com a íntegra de meus quadrinhos favoritos. Lembro que um texto introdutório comparava a argentininha cabeluda a um outro ícone das HQs, o americaninho careca Charlie Brown. Não recordo o teor exato da comparação – nem pretendo parar tudo e ir escarafunchar o livro para conferir; mas sejamos francos: precisa?

Quem conhece Mafalda e Charlie sabe perfeitamente os pontos cruciais. Ambos são crianças que têm sua tchurma, suas preferências (baseball para ele, Beatles para ela), seus irmãos caçulas. E as semelhanças param aí. Mafalda, a contestadora, tem menos de dez anos quando fica esperando ansiosamente a cegonha trazer seu hermanito, quando pede ao amigo Felipe que escreva coisas que ela ainda não sabe (entrou na escola e foi alfabetizada depois dele), quando faz blergh para o prato de sopa trazido pela mãe. Em tudo mais, Mafalda é adulta; alter ego de Quino (o cartunista) para questionar os anos de repressão argentinos, a formação das famílias burguesas, a política internacional, a realidade profissional da mulher, o conflito de gerações. Mafalda está plenamente inserida em seu contexto e, em termos de agudeza, até o supera. Seus olhinhos engajados, pacifistas, não são vítimas e sim críticos de uma época. Sua perplexidade histórica é a dos que batalham, não a dos que apanham. Tanto que está em pé de igualdade com os adultos da tirinha, os quais aparecem com cara, dúvidas, conflitos e voz. Mafalda é nossa porção gente grande que toma de empréstimo a coragem infantil.

E Charlie Brown? Charlie Brown é nosso medo infantil que segue alive and well mesmo quando somos gente grande. É um looser. É quem nos sentimos ao receber bordoadas do sistema, seres indefesos diante de vozes autoritárias incompreensíveis. Diante de ordens sem rosto. Diante de crueldades na escola, fracassos no esporte, amigos que sacaneiam e paixonites em fratura exposta. Diante de uma vidinha que é isso aí, diariamente o mesmo feijão com arroz (ou pão com minduim), sem perspectivas muito maiores que chutar a bola, finalmente. Sem ideologias muito mais longas que vencer a apresentação no colégio, a fantasia de Halloween, o castigo da diretora, o olhar em que nos penduramos e não nos vê. O labirinto intrincado de cada 24 horas.

Por que eu trouxe à tona a nada mole vida de Charlie Brown? Porque hoje faz 61 anos que a tira Peanuts – e Charlie, e Lucy, e Linus, e Woodstock, e Snoopy... – entrou em nossa nada mole vida. E para que nós, embora sejamos Mafaldas convictas, não deixemos de observar com alguma ternura nossa parte dependente do cobertorzinho de estimação, nossa chatice que se debruça em piano alheio, nossa inocência que não desiste de acreditar na Grande Abóbora (eu acredito!). Que ainda aguarda, sempre aguardará, um cartão de Valentines da nossa garotinha ruiva.

Mas que suspirará um “que puxa” e seguirá a vida, livre e mafaldamente, quando ele não chegar.

7 comentários:

Fábio Alves disse...

Sempre curti Charlie Brown. Aquele jeito melancólico era um diferencial nos desenhos infantis. "Que puxa..."

Millena disse...

Adoro o Charlie.Gostei de poder relembrá-lo.

Anônimo disse...

Adoro o Charlie

Anônimo disse...

Adorei visitar seu blog, adoro o Charlie e a Mafalda, desta possuo vários quadrinhos, que infelizmente por conta do dia-a-dia corrido, acabo esquecendo-os. E não é que me deu uma bela vontade de reler alguns?

Abraço Fernanda e um bom começo de semana.

Unknown disse...

Mt bom o Charlie! Curti!

Du Santana disse...

Curto muito o inconsequente Calvin (Calvin e Haroldo), Charlie brown e mafalda, leio de vez em quando. Achava ela adulta demais ara uma criança, mas vc falou que ela é um alter ego do autor Tá explicado. Muito belo então. Bom gosto o seu. ^^

Rayla Lopes disse...

Ah, eu adoro o Charlie! É muito bom relembrá-lo (:

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