quarta-feira, 6 de junho de 2012

O maior bode

Limpo o armário de alguns jornais recentes (só por distração histórica os jornais que se acumulam não estão catalogados entre as pragas do Egito). Entre eles vem uma página do dia 25 de maio, imediatamente posterior ao jogo que eliminou o Vasco da Libertadores. Pra quem não lembra, bastava que o Gigante empatasse sem ser no zero a zero, mas o meia Diego Souza perdeu um gol embaladinho para presente no início do segundo tempo. Furor entre os torcedores. O Roberto Dinamite que preside o Vasco, entretanto – revela a folha de esportes que desentoquei –, teve a elegância de eximir Diego de toda culpa e ainda caprichou no adendo: “Costumo dizer que não perderia aquela chance porque não estava em campo. Se estivesse, poderia perder também”. Très chic.     

Como são imperdíveis os gols que não desperdiçaríamos porque não passamos no teste para entrar no time! Como são ridículas as questões que não erraríamos porque nos recusamos a fazer Enem! Como são estúpidas as decisões amorosas que não tomaríamos porque fugimos ao mergulho do compromisso! Como são disparatadas as respostas que não daríamos porque nos avestruzamos ante a iminência das perguntas! Nós – que tão infalivelmente resolvemos problemas não tidos, que tão estrategicamente saldamos dívidas não contraídas, que tão sabiamente chovemos soluções não solicitadas, que tão santamente realizamos milagres imaginários; nós, perfeitos solucionadores do que não nos compete, ideais paladinos de injustiças apontadas de camarote, heróis formidáveis de Gothans que dispensam nossos serviços; nós – que fácil é acharmos bode expiatório pra nos dar satisfação dos perrengues que não nos cabem! Alegremente nos apossamos do martelo e da toga, enfiando no erro alheio narizes repletos de boa intenção. Esse gol até minha mãe fazia, zombamos protegidos pela sagrada distância.

Não se trata de defender a omissão diante de escolhas desonestas, serviços conscientemente porcos e deliberadamente burros. Ninguém disse que devemos engolir qualquer atitude estrupícia que nos meterem na goela. Mas uma coisa é fiscalizar com zelo esperto aquilo que nos tange, e outra diversíssima é compensar nossas carências botando lente de aumento nas mancadas do vizinho, xerifando (com direito inventado) quem falha no que jamais tentamos. Uma coisa é ser crítico; outra é ser entrão. Uma coisa é ter o saudável inconformismo dos que merecem e buscam; outra é ter o muxoxento recalque dos que invejam e parasitam.

Dizer "eu faria" é mascarar-se do "não posso". Negócio de quem tem mais o que não fazer.

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