domingo, 18 de novembro de 2012

The yes men

Dez anos de formatura na faculdade. Bodas de estanho de nossa turmita com o bacharelado. Alguns núcleos ainda se esbarram, se apadrinham, mas muito por causa da data redonda surgiu a necessidade: bora reunir o grupo todo para celebrar? Bora. Primeira tentativa em setembro, mês do aniversário: comunidade criada no Face, hipóteses levantadas, decidiu-se um restaurante. Venha o restaurante. Afora um ou três pilhados, entretanto, a coisa foi esfriando no esquecimento; hipóteses viraram desculpas conforme chegava a data aventada. Entre os animados e firmes, nossa colega de outro município, quaquilhões de afazeres e um casal de gêmeos pequenos. Vou sim, vou sim, vamos, vamos. Mas andorinha só não faz reunião, e o projeto faleceu de inanição aguda. Paciência. Algum tanto depois, achei que a turma merecia revanche contra as cotidianices, mais uma chance de se encontrar comme il faut, e voltei a amofinar com insistências. Que tal um evento de fim de ano, com direito a amigo oculto literário? Reacordou o ânimo geral: bora. Discussão calendária e relógia no Face, hipóteses levantadas, decidiu-se – não um restaurante – um shopping. Venha o shopping. E as várias confirmações, por problemas vários, desconfirmaram no dia. Na hora. Nossa colega de outro município animada e firme: vou sim, vou sim, já estou a caminho do Rio! Celebramos eu, Marido e ela, em nome dos próximos e distantes ausentes. Naturalmente o amigo oculto não houve, houve o amigo presente; fiz questão de, antes, passar na livraria e levar para a colega um de crônicas da Martha – o que mais ou menos equivale a eu cravar comanda da Imperial Ordem da Rosa em peito alheio. Honras de estado e bandinha.

Vejam: não discuto que imprevistos, maçadas, cansaços, esquecimentos, distâncias, obrigações acontecem, e são perfeitamente justificáveis (sobretudo nesta época atabalhoada do ano). Por isso mesmo não tenho remota intenção de crítica. Soa mais ensolarado o caminho oposto: exaltar a trupe do sim. O pessoal que, a exemplo de nossa parceira de faculdade, é fã inveterado de abrir caminhos. A turma que acredita em apaixonar-se por ideias felizes ainda que incômodas, ainda que inesperadas, ainda que novas, ainda que jota-pito-fernandes; ideias inéditas na agenda, que forçam um bocadinho a barra por não terem antecipadamente entrado na história. O povo que tem rotina de aço e alma de pluma, que consegue enfiar proezas de tempo na já abarrotada piscina de tarefas, que tem coração de mãe batendo na folhinha, que é capaz de fazer caber sempre mais um – amigo, conselho, filme, livro, por que não? filho. A galera que é flexível como músculo de rato para passar pelas frestas improváveis; alada como pégasos de lenda, para seguir por trilhas ainda não aplainadas. Não digo os que só dizem sim porque tímidos, indecisos, imaturos, pusilânimes, culpados profissionais, não; falo dos que escolhem. Dos que decidem. Dos que preferem querer, dos que vieram ao mundo com a natureza de desejar, a vocação de facilitar, o talento às vezes essencial de desbravar. Dos que se encantam sinceramente pelas oportunidades e não ferem nem se ferem para abraçá-las (quase) todas: têm também limites, porém nasceram com a faculdade de evitar assumir o não como regra.

Falo das criaturas exaustas de expediente que arrumam jeito de brincar duas horas por noite com a prole, sem permitir que transpareça aborrecimento por debaixo da máscara – porque não há máscara. Falo dos namorados ainda estranhos à família que topam com alegria autêntica um níver de sobrinho no play, e catam diversão no meio do quibe frio e Coca-Cola fervente. Falo dos que voltam o quarteirão inteiro porque esqueceram o presente da secretária; dos que se aventuram a acampar uma vez na vida nem que seja para jurar que nunca mais (e quase arrebentam de rir no processo); dos que pipocam de curiosidade ao ser convidados para restaurante argelino ou tailandês; dos que, devidamente examinados e equipados, experimentam bungee jumping ou arborismo; dos que interrompem a agenda para ciceronear o hóspede por bondinhos e Corcovados; dos que pausam planejamentos para acompanhar um – talvez não reencontrável – chamado de vida. Falo dos que prosseguem razoáveis, responsáveis, mas com a dose ultrajovem de loucura que eu (sabe-se lá) nem tenho quanto devia, e é exatamente a sinapse que faz um pulso de existência bater.

Falo e preciso dos que não conferem a hora: acreditam em acontecer.

2 comentários:

Ubiratan Rodrigues disse...

Muito bom!
Parabéns pela inspiração e pelo belo texto!

Fernanda Duarte disse...

Superobrigada pelo carinho, meu querido! Tudão de bom para você! ;-)