segunda-feira, 4 de março de 2013

Me poupe

Moça passando na rua, celular em punho. Flagro uma frase de alto e claro som: “Me poupe dos detalhes, Ana Cláudia”. Como autossuposta escritora, tenho uma pena aguda de ser poupada dos detalhes; quero detalhes, preciso de detalhes, muitos e suculentos. Tenho a curiosidade culpada dos precipícios, aquela coisa devoradora que se interessa mesmo pelo que não lhe interessa – aquela dúvida faminta que interrompe a zapeada pelos canais ao pescar um restinho de animal-planetice chatérrima, empenhada num ângulo inédito do ataque das tarântulas. Espírito de acumuladora: deixa eu assistir porque posso precisar, posso precisar, posso precisar.  

Informações excessivas aborrecem fatalmente a espécie, mas informações há que não aborrecem nunca, pelo menos em se tratando de minzinha: as de gente. De gente por dentro. Quem cá viveu, o que fez, o que quis, em especial a quem e como amou, como peitou, como decidiu. Como se descobriu. Sou daquelas que escarafuncham os bastidores das gentes e, ao mesmo tempo, são sepultadas com os recém-descobertos segredos – a não ser que não sejam segredos. Gosto de saber mas não revelo, gosto de saber por aprender e não por divulgar. Preciso simplesmente conhecer o que é possível neste mundo; medir, nas comparações, o limite do frequente e do ocasional. Averiguar por estudo interno. Por arquivo. Não menos por defesa.

Existem desses detalhes construtores, que nos amadurecem como profilers e como habitantes desta nave louca. Há também, entretanto, os que ninguém merece. Os apenas exibidos como troféu de caça, os calculadamente fabricados para a posteridade do Paparazzo. Me poupe, por exemplo, das sordidezinhas que tal ou qual subcelebridade realizava na cama (mais especificamente, fora dela). Me poupe de toda a trama de perfídia e boicote que os EUA vêm promovendo contra a sua – exatamente a sua – família há 57 gerações. Me poupe de cada minúcia hospitalar dos seus oito filhos, englobando inflamações pusentas, orifícios verdolengos e perebas inqualificáveis. Me poupe das suas minúcias hospitalares, sobretudo as que tiverem relação incidental com o baixo-ventre. Me poupe de seus comentários tão-somente xerocados. Me poupe de suas teorias educacionais tão unicamente descabeçadas. Me poupe de suas fofocas. Me poupe de suas implicâncias. Me poupe de seus clichês. 

Não me poupe dos detalhes que pavimentam estrada para além do era uma vez.

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